Tuesday, June 23, 2015

Rubi e a cultura de exaltação da pobreza




Em que momento começamos a ser uma sociedade politicamente correta? Talvez as velhas novelinhas mexicanas tenham criado a sociedade pudica que temos hoje. Há também a possibilidade das produções latinas apenas refletirem uma realidade.  





Estou revendo "Rubi" (uma novela mexicana de 2003), e vou aos poucos percebendo como muitos mantras da cultura latina estão presentes ali. A jovem interpretada por Barbara Mori cresce cercada pela pobreza. E é criticada por ambicionar algo melhor. Ali os pobres que não almejam a riqueza, é que são felizes. Por que o dinheiro não é tudo. Há quem diga que isso é uma verdade , mas a novelinha vai construindo a maldade da vilã Rubi em frases como "Amor não paga as contas".  Por mais doloroso que possa ser para os apaixonados, está é uma verdade.  









A cultura latina exalta a pobreza, ainda na televisa temos o menino Chaves. Comumente lembrado como pobre e de bom coração. Em Rubi a noção do rico malvado é desconstruída, um paradoxo já que a novela também exalta a pobreza.  







A mocinha da novela é a menina rica, inocente demais para ver alguma maldade em Rubi. Tudo que ela quer é viver um grande amor. A geração Y é um fenômeno mundial. Mas é inevitável deixar de notar alguma semelhança entre os discursos. Hoje a meta é sempre viver um grande amor, seja com a já batida ideia do "encontre o que você ama, e nunca trabalhará", ou na busca de algum sentido para a vida.  





A sociedade vai deixando de lado as moças pudicas, das novelas mexicanas. Esse clichê vai sendo deixado de lado. Torna-se uma marca do passado que precisa ser esquecida. Mas a mesma sociedade vai mergulhando no puritanismo, inato as tramas mexicanas. Tudo é uma grande tempestade. A cada cinco minutos há uma pausa dramática. A diferença é que na novela  a pausa dramática é uma música de suspense junto com uma careta do ator em um angulo confuso, e logo depois dos comerciais você percebe que era só uma artimanha para que você não mudasse de canal. Mas na vida "real" é um post no facebook que vai ter centenas de comentários. Alguns extremamente revoltados. Outros fazendo questão de defender o que o comentário anterior atacou.  









O fato é que as pessoas se importam demais com qualquer coisa. Até com aquilo que elas não fazem ideia do que seja. Já que é necessário ter uma opinião. E para ter uma opinião, a ficção nos ensina que é preciso escolher um lado. Um deles é malvado, e o outro é bonzinho. E as pessoas incorporam isso, elas querem trazer isso para a realidade. Em uma ânsia por simplificar o mundo, e poder dizer que está sendo o bonzinho. 






As novelas mexicanas nos ensinaram que os bonzinhos sempre se dão bem no final. Isso até pode trazer uma mensagem bonita para uma sociedade. Mas estamos chegando a um ponto em que a mediocridade barata é confundida com algo grande. Como ser o mocinho e fazer tudo certo. Porque valores são imutáveis. E claro, essa é uma outra lição da cultura latina que as tramas da televisa nos deixaram.  





É triste ver que a sociedade busca o que há de pior nos indivíduos que fizeram algo que a massa não seria capaz de fazer. O objetivo é sentir-se justificado em  sua inércia: não vale a pena se expor a algo que extrapole as linhas de certo e errado.  





Talvez o grande mal da nossa cultura tenha mesmo vindo das novelas. Mas não foi uma emissora ou outra que fez isso. Foi a própria sociedade que não soube definir o que é realidade, ou ficção. E assim vamos agora sendo condenados a uma sociedade que idolatra a mediocridade.  









A irmã de Rubi quer apenas  encontrar seu grande amor. Que diferença faz se ele é um chofer sem grandes perspectivas, ou um médico com grande potencial. É essa a lógica que tentaram nos vender. A pergunta é: realmente não faz diferença? São todos iguais? O que importa é o que está dentro do individuo? 







Alguns contribuem mais com a sociedade. Outros menos. Nossa sociedade em sua essência sempre buscou ter limites claros entre os elementos de diferentes níveis sociais. Felizmente, gosto de pensar que estamos superando isso. Que há a possibilidade de trânsito entre os níveis, sem que fiquemos refém da figura do pobre honesto, que é feliz e está satisfeito em sua pobreza, sem ambicionar algo mais. Apenas porque algum dia o fizeram acreditar que ganância, ambição e inveja são algo ruim. A verdade é que os sentimentos em sim, não são nem bons nem maus. O uso que se fará deles é que define isso.  







Eu nunca me esqueci do final de Rubi. Ela acaba pobre, sem a beleza que um dia a levou a ser rica. Ela não fez o melhor dos caminhos para atingir seus sonhos. Mas é hipocrisia pensar que é estar feliz que fará alguma mudança acontecer.  Tristeza e raiva provocam mudanças. Não podemos condenar Rubi por querer mais, e saber que o mundo não é um mar rosas onde todos devemos apenas buscar o nosso "...e viveram felizes para sempre..." 








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